Às Margens do Valão

 



Eu sabia que aquela viagem não seria nada parecida com um passeio pela Avenida Champs-Élysées no Dia dos Namorados, com aquele perfume no ar. Mas, mesmo assim, eu topei a tarefa de conhecer as entranhas de uma estação de tratamento de esgoto. Afinal, o que não fazemos pela educação, não é mesmo?

Lá estávamos nós, um grupo de professores de ciências, todos preparados para desvendar as mazelas causadas pela falta de saneamento básico. Sim, porque entender como funciona uma estação de tratamento de esgoto da cidade não é apenas um conhecimento curricular, é uma forma cidadã de entender o contexto social que permeia o universo dos nossos alunos.

Então, lá fomos nós, em um ônibus da prefeitura, em pleno calor escaldante, em busca desse precioso conhecimento. O primeiro ponto turístico da nossa “excursão”: um valão. E, por mais que eu achasse aquilo imundo e pensasse na moradia indigna da população, não pude deixar de imaginar aquele lugar com águas límpidas, um bosque encantador e crianças andando de bicicleta. A imaginação, sempre nos pregando peças!

E enquanto eu “contemplava” aquele valão, ouvindo sobre o compromisso do Brasil em universalizar os serviços de saneamento até 2030, me via pensando: "2030 está logo ali! Precisamos correr para ver essas instalações ficarem prontas e os rios voltarem a viver!" Quem sabe aquele valão mude de cor, e os românticos possam finalmente se sentar em um banquinho às suas margens para roubar um beijo inocente. Sonhar não custa nada!

A explicação sobre como o esgoto seria desviado para um elevatório e bombeado para a estação de tratamento foi interessante, mas eu não conseguia tirar da cabeça a ideia de que tudo isso era para limpar o que a sociedade não vê depois que dá descarga no banheiro. Literalmente, tirar a sujeira debaixo do tapete, ou melhor, do vaso sanitário.

Em outra parada, entendemos a dinâmica da construção de uma estação de tratamento de esgoto. Muito concreto e metal para limpar o que ninguém quer tocar. A minha mente se abria para todas as informações. Sim, é possível cuidar do mundo, fazer a nossa parte, mesmo que isso envolva lidar com o lado menos glamoroso da vida.

E então, o ônibus parou em uma estação (ETE) já em plena atividade. Fomos todos recebidos com cordialidade, uma palestrante afinada e uma formadora muito gentil. Tudo o que o corpo docente precisa para superar as adversidades da profissão, até mesmo as olfativas.

Vimos como o esgoto chega e como sai tratado, todas as etapas do processo. Subimos uma escadaria que nos levou até a m... bem, até a "matéria orgânica não processada". Mas nem o odor desagradável, nem o calor excessivo nos fizeram desistir de entender que o Brasil tem jeito, que podemos viver com mais dignidade.

Claro, não passeamos na Champs-Élysées e não compramos perfumes importados, mas o que importa é perceber que fazemos parte desse planeta, e se todos fizermos a nossa parte, talvez possamos torná-lo um lugar mais limpo, saudável e, quem sabe, até um pouco menos fedido. Afinal, o conhecimento é o primeiro passo para a mudança, mesmo que ele venha acompanhado de um cheirinho nada agradável.


Um comentário:

Nathalya pimenta disse...

Parabéns professor,que bom que temos mais pessoas que ainda acredita que podemos viver em um país digno, temos muitas coisa a moldar ainda. Continuem sempre evoluindo, espero um dia poder ta participando desse trabalho,que vocês tragam esse projeto pra dentro das escolas para que todos possam se concientizar e ajudar.